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Uma visão geral da ciência para compreender a Terapia Sistêmica

  • Thayane Salgado
  • 23 de nov. de 2015
  • 4 min de leitura

O destino da humanidade é desconhecido, mas sabemos que o processo de existir modifica-se.

Edgar Morin

Para uma boa compreensão do referencial epistemológico da Terapia Familiar Sistêmica é preciso delinear o movimento da ciência até a atualidade, saindo de uma ciência tradicional para uma ciência contemporânea.


A ciência que prevaleceu até o início do século XX apresentava um conjunto de concepções que a caracterizava a partir da tentativa do ser humano de se comunicar e conhecer o mundo. Nesse percurso, na busca por princípios explicativos, ela elegeu situações invariáveis para estudar. Para descrever e dominar o funcionamento da natureza, o homem precisava ficar excluído, numa posição de observador de um mundo objetivo e manejável. A ciência tradicional era descrita como um estudo conduzido por regas, ordem e previsão.

A objetividade constituía-se como um dos fundamentos científicos que se tornava possível a partir de verificações empíricas. Quanto mais o observador se mantém distante, mais objetivo é a descrição cientifica.


Como observador, o homem tentava a todo instante ultrapassar a complexidade natural do mundo, reduzindo, simplificando e fragmentando a natureza em leis simples, deterministas e reversíveis. Esse momento apresentava-se como o “Paradigma da Simplificação” (Morin, 1982). Os sistemas complexos eram analisados por partes isoladas e, assim, eram compreendidos como “agregados mecanismo de partes em relações causais isoladas uma das outras” (Vasconcellos, 1995, p.39). Para Lazlo (1972), essa forma de estudo apresenta dados importantes sobre interações específicas, auxiliando no desenvolvimento de técnicas para manipulação deles.


Para Morin (1983), existem dois efeitos da simplificação: i) operação disjuntiva, que separa tudo, as categorias, o objeto do meio, o biológico do humano, entre outros; ii) operação de redução, que reduz cada coisa a uma unidade simplificada.


Como resultado, têm-se uma ciência fragmentada em áreas de conhecimento que não se comunicam e apresentam dificuldades de contribuir interdisciplinarmente. Todo esse processo foi oriundo do momento em que a ciência utilizou a prática experimental em lugar da observação passiva. Isso tornou a ciência matematizável substituindo as questões qualitativas por quantitativas, afastando-se da sociedade e impondo um conflito entre a tradução animista (como fonte de conhecimento e de verdade) e a ideia de conhecimento objetivo (Monod, 1970).


Diferentemente, a ciência da atualidade apresenta uma atividade inovada e inclui temas que escapa do mito newtoniano ao perceber ser impossível uma lei geral da natureza (Prigogini e Stenpers, 1984). Houve um período de revolução científica na qual a ciência substitui conceitos sem abandonar o procedimento científico, mas por perceber limitações próprias dos conceitos e métodos utilizados anteriormente, o que provocou questões ainda sem respostas e ainda em reformulação.


Considerada como uma ciência emergente, destaca-se por ser um "paradigma" incompleto e ainda em construção. Apesar de enxergar de uma forma mais ampla questões antes ignoradas, não abandonou seu caráter "científico".



E nessa transformação dentro da ciência, como estavam as ciências biológicas e sociais?


As ciências biológicas e sociais perceberam que o modelo mecanicista e o modelo linear eram insuficientes para compreender e discriminar processos complexos do dia a dia da natureza e do mundo, no que se refere os seres vivos e as sociedades.


Como a ciência limitava seu modelo a partir do objeto newtoniano, as teorias que não se baseavam em testes experimentais eram descartados. Isso fez com que as ciências biológicas e sociais ficassem submetidas ao reducionismo e a natureza viva vista em termos mecânicos. Alguns cientistas dessas áreas acabaram migrando para o campo da filosofia, já que era permitido nesse âmbito a defesa de ideias diferentes.


Dessa forma, as ciências biológicas e sociais foram obrigadas a evoluírem paralelarmente ao desenvolvimento da física que obteve sucesso, limitando-se ao modelo restrito da ciência. Contudo, as alternativas encontradas por elas para alcançar seus próprios modelos não foram tão bem sucedidas. Primeiro, tentaram aplicar os conceitos e fundamentos das ciências físicas e químicas às teorias dos fenômenos sociais, o que se provou insatisfatório. Além disso, insistiram em declarar que eram extremamente diferentes da física e química. Todo esse processo originou uma defesa e preconceito epistemológico que provocou um atraso no conhecimento sobre a sociedade, a vida e a mente (Bertalanffy, 1971).


Somente com o desenvolvimento da física e sua aceitação da complexidade do mundo, da ideia de auto-organização, da irreversibilidade, dentro outras, parece ter sido autorizado as ciências uma maior discussão sobre as delimitações dos espaços científicos e uma avanço das ciências físicas na concepção de um universo fechado para um universo aberto (Prigogine, 1980).




Referências


BERTALANFFY, Ludwig von. Robots, hombres y mentes. La psicologia en el mundo moderno, Madri: Ediciones Guadarrama, 1971.


LASZLO, Ervin. The system view of the world. the natural philosophy of the new developments in the sciences. Nova Iorque: George Braziller, 1972.


MONOD, Jacques. O acaso e a necessidade. Ensaio sobre a filosofia natural da biologia moderna, 2ª edição, Lisboa: Publicações Europa-América, s. d. Original Francês, 1970.


MORIN, Edgar. Ciência com consciência. Lisboa: Publicações Europa-América, s. d. Original Francês, 1982.


MORIN, Edgar. O problema epstemológico da complexidade. Lisboa: Publicações Europa-América, 1983.


PRIGOGINE, Ilya. In Mony Elkaïm et al. Openness: a round-table discussion. Family Process, Nova Iorque, vol. 21, nº 1, pp. 57-70, março de 1982. Mesa redonda realizada em Bruxelas. publicado orginalmente in Cahiers Critiques de Thérapia Familiale et de Pratiques de Réseaux, Bruxelas, nº 3, pp. 7-17, dezembro de 1980.


PRIGOGINE, Ilya; STENGERS, Isabelle. A nova aliança. A metamorfose da ciência. Brasília: Editora Universidade de Brasilia, 1984.


VASCONCELOS, Maria José Esteves de. Terapia familiar sistêmica: bases cibernéticas. São Paulo: Editorial Psy, 1995.







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